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quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Poeira de Estrelas


"Há de surgir uma estrela no céu cada vez que 'oçê' sorrir...
Há de apagar uma estrela no céu cada vez que 'oçê' chorar..."

O contrario, também, bem que pode acontecer, se levarmos em consideração o número quase impronunciável de galáxias espalhadas pelo firmamento. Cada uma delas lar de bilhões de estrelas. Cidades grandes onde elas nascem e passam suas infâncias brincando com planetas, luas e cometas. Se relacionam em grandes comunidades e bairros estelares, circulando pelas highways galáticas a grandes velocidades. Envelhecem perdendo sua aparência original e finalmente morrem. Exatamente como cada um de nós, a todo instante uma estrela nasce e outra morre, nos confins da nossa galáxia e de todas as outras.

As estrelas nascem de grandes "nuvens moleculares" de gás, poeira, rochas, gelo e elementos químicos diversos, colecionadas preferencialmente no perímetro galático e suas vizinhanças. Em nosso campo de visão existem diversas dessas maternidades estelares, onde agora mesmo um incontável número de protoestrelas estão se formando, embriões que podem nascer a qualquer momento. Podemos citar a grande nebulosa do Caranguejo, a nebulosa da Cabeça do Cavalo, os Pilares da Criação e muitas outras. Nascem graças ao fenomeno da acresção, uma propriedade do nosso universo que faz com que a matéria sempre tente permanecer unida, se ajuntando para formar amontoados de densidade sempre maior. Aos poucos estes "grumos" passam a exercer um campo gravitacional suficientemente relevante para atrair o material ao redor, que aos poucos começa a girar mais e mais em uma espiral em direção àquele novo centro de massa, caindo e girando cada vez mais rápido e em maior quantidade. E com a elevação da densidade e da velocidade, a temperatura começa a subir, até que se atingem condições para o início de reações nucleares de fusão. Neste momento, a estrela se incendeia, irradiando a energia que, equilibrando a enorme pressão gravitacional, a manterá viva pelas eras seguintes.

As estrelas morrem, quando todo o seu combustível nuclear se acaba. Ela começa a vida fundindo Hidrogênio em Hélio, depois o Helio em Litio, o Lítio em Berílio e assim sucessivamente ao longo da tabela periódica, gerando energia para sobreviver e, ao mesmo tempo, forjando os elementos básicos da química complexa e da vida. Dependendo do tamanho da estrela e consequentemente do poder de seu campo gravitacional, ela pode continuar nessa produção de elementos cada vez mais pesados, até o ferro, no coração de seus núcleos. Mas um dia ela não consegue mais e sua vida chega ao fim. Estrelas pequenas têm vidas loooongas, produzem poucos elementos e morrem de forma discreta. Como nosso sol que viverá uma vida de 8 bilhões de anos, terminará como uma anã branca de carbono e morrerá em uma nebulosa planetária, projetando suas camadas externas lentamente como uma bruma cósmica. As grandes tem vidas curtas, de algumas centenas de milhões de anos, geram os elementos pesados necessários à nossa civilização e morrem em violentas explosões, espalhando seus corpos pelo espaço e fertilizando outras nuvens moleculares. São as Supernovas, uma das classes de explosões mais poderosas observáveis.

As Supernovas são tão poderosas que são capazes de continuar as reações de fusão, produzindo em segundos o que a força da gravidade não conseguiu produzir em milênios a fio. O ouro, o urânio, o Tungstênio... tudo abaixo do ferro na tabela periódica surge nestas explosões. Sabe-se que no início da formação do universo as estrelas eram todas colossos de vida curta e mortes violentas. E foi devido à morte de uma ou mais dessas matriarcas que nosso sistema solar pôde ter a riqueza química de hoje, com o carbono, o nitrogênio, o oxigênio e a água em abundância para que nós tenhamos nascido. E com os metais preciosos de nossas jóias, os elementos radioativos em nossos hospitais e os minerais de terras raras no touch screen de nossos smartfones. Cada átomo do nosso corpo e de tudo no mundo já esteve um dia na caldeira nuclear do coração de uma estrela super gigante, morta e reciclada para formar o nosso Sol, uma criança amarela de 4,5 bilhões de anos. E também os seus brinquedos giratórios dentro da grande nuvem de Hort. E dentre estes brinquedos, o nosso planeta Terra.

Como disse o grande Carl Sagan e repetido por muitos como um grande clichê, "somos todos poeira das estrelas!" E quando morremos, devolvemos à Terra esta poeira. E quando a Terra morrer,  pulverizada pelo Sol em sua velhice de Gigante Vermelha, a poeira volta para o espaço cósmico, mesclada com os restos mortais desta nossa estrela favorita. Irá alimentar outros nascimentos, de outras estrelas e talvez planetas e luas e cometas... Assim é a realidade da matéria, apenas um empréstimo que será cobrado um dia. E temos todos que devolve-la. Nada é eterno. Nem o Sol nascerá para sempre em nossas manhãs. Ele surgiu provavelmente no exato momento em que algum ser vivo, de alguma galáxia distante, sorria à sua maneira alienígena. E do mesmo modo, algo estará chorando, em algum lugar, quando ele se apagar para sempre.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

O que aparecerá depois da névoa?


Já em adiantada leitura de um extraordinário livro do Ronaldo de Freitas Mourão, que comprei em um excelente sebo no Catete, me peguei fazendo notas de rodapé com minha lapiseira. De repente, entretanto, percebi a disparidade da minha ousadia. Trata-se, "apenas", daquele que pode ser o maior astrônomo da história brasileira, fundador do Museu de Astronomia e Ciências Afins.  O que teria eu a acrescentar às conclusões de um verdadeiro campeão da ciência? A obra em questão se chama "O universo inflacionário" e é particularmente belíssima pela simplicidade e sobretudo a acessibilidade com que discorre sobre a dinâmica de nosso universo, de forma que mesmo um leigo como eu é capaz de compreender e ser absorvido pela leitura. Ocorre, porém, que a edição que leio é de 1983 e, de lá para cá, muita coisa foi descoberta e as dúvidas que antes tinham ares de mistério, mesmo para um escritor do calibre de Mourão, agora são de domínio de uma pessoa tão comum como eu.

O livro fala dos intrigantes "Quasares", objetos que estavam muito além das galáxias mais distantes do cosmo. Ora, hoje sabemos que os Quasares são apenas a visualização direta e perpendicular do jacto de partículas e radiação que é regurgitado pelos buracos negros supermassivos, presentes no núcleo de quase todas as galáxias. Fala também da estranheza da dinâmica dos braços das galáxias espirais, sem levar em consideração a interação gravitacional com a matéria escura. Ele, esperançoso, cita o lançamento iminente do telescópio espacial, que poderia elucidar como se interagem os superaglomerados de galaxias. hoje, após varios observatórios espaciais (Hubble, Spitzer, Chandra, Kepler, etc), projetos de mapeamento global do cosmos (Galaxi Survey, GALEX, etc) e poderosas simulações computacionais (como a Milenium), já se conhece a grande teia cósmica, com os grandes superclusters grudados em filamentos e nós pela atração "viscosa" da matéria escura.

Um dia, a chuva já foi um grande mistério, atribuído a divindades e implorada por meio de sacrifícios de animais e pessoas, antes de conhecermos o ciclo da água e os caprichos da meteorologia. Até pouco tempo, a força gravitaional, quando aplicada através do vácuo do espaço, perturbava a física de Newton, levando ao conceito equivocado do "eter". Hoje, depois da Relatividade Geral, conhecemos a geometria variável do espaço tempo e sua interação com os corpos massivos. Hoje, quando pegamos nosso caderno de calculo do primeiro período, poderemos achar fáceis os exercícios que nos tiravam o sono na época. Mesmo sem nunca mais termos praticado. Hoje as crianças parecem muito mais espertas do que fomos nos anos 80, sem os canais a cabo, os videogames sem joystick e os tablets. Quanto mais caminhamos para frente, mais a névoa se afasta, e mais horizonte aparece em nosso campo de visão.

Mesmo as nossas mais inabaláveis certezas e medos, podem um dia não passar de fantasias infantis do passado. Basta imaginar o quão maior será nossa capacidade de ver e entender. Como nossas experiências irão mudar nossa visão? até onde passaremos a enxergar? Só saberemos se abandonar-mos o conforto da privilegiada posição que ocupamos, de onde podemos ver tudo até a névoa lá adiante e caminhar em direção a ela. Caminhar para o desconhecido. Se perder faz parte do processo de se encontrar e encontrar seu lugar cada vez mais próximo da verdade. Apenas pela ousadia, ultrapassamos o nevoeiro da ignorância.